sábado, 22 de setembro de 2007

Waiting

Esperar é torturante. Acorda-se angustiado. Dorme-se de cansaço. Entre uma coisa e outra, sofre-se por antecipação. Eu espero algo. Sou um homem paciente, mas a espera me tortura. Cada minuto pode ser o minuto que marca o fim da espera. Mas não tenho tido sorte.
O que aguardo pode chegar por qualquer meio. Carta, mensagem eletrônica, um bipe no celular, um pacote esquecido no tapete da porta, uma visita surpresa, um cartão. Observo a tudo ansioso, tenso. Será que hoje a espera se acaba?
O carteiro chega e meu coração bate descompassadamente. Há um pacote em suas mãos. Será que é para mim? Recebo apenas contas e uma carta de uma empresa de telefonia me ofertando um celular novo. Decepção.
O email acusa uma nova mensagem. Corro abrir e vejo que se trata de um boletim de notícias que assinei. Nervoso, cancelo a assinatura. Dois dias depois, volto a assiná-lo. No fundo, quero receber essas mensagens inúteis pois nutrem a esperança de que a espera tem fim.
O celular toca e é alguém da família querendo saber de mim. Estou bem, minto. Ninguém precisa saber que sofro porque espero. Converso rápido para não ocupar o telefone por muito tempo. Alguém pode ligar.
Outro dia, ao conversar com alguém pouco importante no telefone, ouvi o toque da segunda linha ao fundo. Meu interlocutor demorou para me deixar desligar. Quando finalmente consegui, a segunda linha ficou muda, não consegui atender. Será que naquele momento minha espera ia acabar?
As vezes relaxo, esqueço que estou nessa angústia. Deixo de olhar o telefone a cada cinco minutos. Não importuno o porteiro com perguntas sobre a correspondência. Esqueço de ligar o computador e aguardar minha mensagem.
Mas esses momentos de descanso duram pouco. Logo algo me lembra que tenho que estar atento.
Fico com raiva. Acho injusto o que estou passando. Em pensamento, grito com os responsáveis por essa tortura. Juro que vou deixar de lado essa insanidade. Esquecer de esperar.
Mas, no fim, volto a olhar ansioso o telefone, a correspondência. Será que um dia isso vai acabar?

quinta-feira, 9 de agosto de 2007

O envelope marrom


Um envelope marrom. Grande. Era isso que todo mundo segurava na mão. Estavam todos na fila, esperando.


E eu também. Mas eu não tinha um envelope marrom. Será que esqueci de alguma coisa?


Olho para um lado, olho para outro e todo mundo tem um envelope marrom. E eu não. Tenho apenas um monte de papel. Cópias de documentos, declarações. Mas nada de envelope marrom.


Não, eu não preciso de um envelope marrom, digo baixinho. Lembro claramente de ter visto repetidas vezes a lista de documentos necessários e nenhum envelope marrom era citado.


Mas por que todo esse povo resolveu trazer um então? Será que é parte do protocolo e eu não sabia? Talvez trazer um envelope marrom seja uma daquelas coisas que ficam subentendidas. Será que eu não entendi?


Vou imaginando que, quando chegar a minha vez de ser atendida, a moça do balcão vai me dizer:

- Mas você não trouxe o envelope marrom?


Vou suando frio, nervosa. Por que, diabos, não lembrei do envelope marrom? Porque era tão óbvio que, mesmo não constando na lista de documentos necessários, o envelope marrom era obrigatório. Só eu não percebi isso.


Penso um pouquinho mais e me acalmo: um envelope marrom não é um documento. Mas todo mundo que chega no balcão deixa o envelope lá.


Ah, meus Deus. Que vou fazer sem o envelope marrom? Vou perder a matrícula. Vou perder a vaga. Seis meses de cursinho, três provas, um escore alto e isso: vou perder a vaga na faculdade porque não tenho um envelope marrom!


Maldito envelope marrom.


Será que alguém na fila tem um envelope marrom sobrando?


Será que tem que ser marrom? Ou branco também vale?


Oh, Deus, que me apareça um alma caridosa, alguém que me conheça e que, por acaso, tenha um envelope marrom sobrando.


Bom, não me resta mais nada além de esperar a hora da moça do balcão me chamar. Não terei o envelope marrom e ela vai me mandar embora sem matrícula, sem vaga e sem envelope.


Ok. Só me resta esperar...


A moça do balcão me chama, pega meus documentos, confere tudo, carimba algumas coisas, me dá parabéns e me manda embora. Não precisei do envelope marrom. Graças a Deus.

segunda-feira, 6 de agosto de 2007

Tia Maria

Tia Maria era magrinha, velhinha, enrugadinha. Falava baixinho, como se não tivesse forças para aumentar o volume. Morava numa meia-água pequena, de quarto, banheiro e cozinha. Cuidava das crianças quando os adultos queriam sair.

Quando Tia Maria cuidava de nós, tínhamos que ser bem-comportados. Ela não teria forças para lidar com capetinhas. Ficava quietinha na poltrona, assistindo TV enquanto estávamos no sofá ou no chão brincando quientinhos.

Tia Maria morava no outro lado da rua e vinha para nossa casa devagarinho. Ela não tinha força para andar mais rápido, nem pressa de chegar.

Ela era magrinha, velhinha, enrugadinha. Morreu quietinha, sem incomodar ninguém.

segunda-feira, 9 de julho de 2007

O homem do apito

Ele fica sentado ao lado da porta de entrada do banco e toca um apito. Entoa melodias as vezes reconhecíveis, as vezes desconhecidas. Passa a tarde assim. Talvez ganhe algum trocado de quem passa. É sujo, maltrapilho. Pobre.

O apito tem um timbre irritante. Para quem está distraído nos escritórios dos prédios vizinhos, o som se mistura aos outros barulhos que vem da rua. Mas, vez ou outra, ele se sobressaí e encontra o caminho até uma platéia cativa. Cativa porque não tem para onde ir.

O som tem o poder de deixar os nervos de quem ouve em frangalhos. É como se martelassem os ouvidos, várias vezes. Repetidas vezes.

As vezes o homem do apito desaparece. Vai importunar outros prédios. Se você der azar, pode topar com ele na porta de um banco, tocando o apito. Se for o caso, tape os ouvidos e saia correndo.

sexta-feira, 6 de julho de 2007

Ai ai ai

Acabei de me tocar que o nome do blog é o mesmo daquela revista horrorosa.... ih...

quinta-feira, 5 de julho de 2007

Luciana e os búfalos

Dizia Luciana que seus avós criavam búfalos. Eram bichos enormes, com mais de dez metros, e viviam na fazenda da família em Paranaguá. Luciana vivia falando dos animais. Gostava de contar como eles eram grandes. E que eram muitos.

Para Luciana, visitar os avós e os búfalos era fácil. Havia uma passagem secreta no banheiro de sua casa aqui em Curitiba. Ela abria a porta do esconderijo e pronto: estava em Paranaguá com seus búfalos.

Búfalos são criaturas grandes, como bois super crescidos e muito mais mal-encarados. No entanto, Luciana adorava-os. Vivia brincando com eles. Passava as tardes assim. E quando sua mãe chamava, ela corria para a passagem secreta e voltava para Curitiba.